segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Savile Row: a elegância masculina tem nome e endereço certo.

Os mandamentos da moda para o homem nasceram numa pequena rua no bairro de Mayfair, em Londres.


A Savile Row é uma das ruas mais tradicionais de Londres 

Corre-se o risco de cair no exagero afirmar que a moda masculina como conhecemos hoje surgiu nessa pequena rua no bairro de Mayfair, em Londres. Pode até não ter nascido. Mas certamente a Savile é o ponto nevrálgico, o centro nervoso do que hoje entendemos como elegância, quando o assunto é moda para homens. Desde o século 18, nos ateliês instalados em suas calçadas, alfaiates passam o dia trabalhando obsessivamente para que os ternos resultem em um corte perfeito.

Se por um lado não dá pra falar em moda masculina sem falar em Savile Row, por outro também não é possível falar em Savile Row sem antes citar Beau Brummel, o homem cujo estilo influenciou toda a aristocracia inglesa entre o fim do século 18 e meados do 19. Brummel era um dos amigos mais próximos do rei George V, tinha forte influência na corte e foi considerado o primeiro dândi da história.

Ele revolucionou  a maneira como os homens se vestiam, num processo que ficou conhecido como The Great Masculine Renunciation -eque acabou por estabelecer a predominância do terno como o supra sumo do dress code masculino. Brummel valorizava a elegância, a discrição. Era avesso aos trajes ostensivos, extravagantes, colorido demais, que estavam muito em voga na época. Segundo ele, alguém bem vestido não é notado, "ninguém olha para trás quando um verdadeiro dandi passa". 


Além de extremamente elegante, Brummel era também excelente com as palavras. A combinação de bom gosto com o talento de falar bem em público lhe rendeu a posição de um dos homens mais influentes no high society da época. Seu estilo tornou-se uma inspiração e um passaporte para alcançar prestígio na sociedade. Algo que foi percebido rapidamente por outros homens.

Mais do que nunca, os homens da corte inglesa atentaram para o poder de um traje discreto, bem cortado, feito milimetricamente sob medida, com os melhores tecidos e pelos melhores alfaiates. Assim, o contexto para que Londres se tornasse uma referência em m oda masculina estava dado. Alfaiatarias como  Gieves & Hawkes estão na Savile desde a segunda metade do século 18. Junto com outras, como a Kent & Curwen e a Norton & Sons, elas construíram a tradição da rua.

Em seus ateliês, até hoje pratica-se a chamada alfaiataria “bespoke”, algo que vai ainda mais longe do tradicional “sob medida”. Nesse caso, o terno é feito a partir de um molde padrão, ajustado de acordo com as medidas do cliente. Na alfaiataria “bespoke”, a modelagem é construída a partir das medidas exatas do cliente  - são pelo menos 30 - e de acordo com suas preferências. 

O termo vem de “be spoken",que em português significa “ser falado” é justamente uma referência às longas conversas que esses alfaiates têm com os clientes. O tempo mínimo de treinamento para um alfaiate ser considerado especialista nesse tipo de trabalho é de seis anos, período em que muitos testes são aplicados - um processo que pouco mudou ao longo dos séculos. 


Tamanha exclusividade cobra seu preço: é comum um terno sair dali  por cerca de 10 mil dólares. A lista de clientes é, portanto, seleta: vai do ex-primeiro-ministro inglês Winston Churchill ao Príncipe William, que encomendou sua roupa de casamento na  Gieves & Hawkes, passando pelos Beatles e até Napoleão Bonaparte. Como a discrição também é moeda valiosa na Savile Row, supõe-se que essa lista seja bem maior.

O auge da rua foi na década de 60, quando centenas de alfaiates trabalhavam na região. Nos anos 80 esse número começou a diminuir. A crise veio no rasto da especulação imobiliária, que transformou a rua num dos endereços mais caros do mundo, e da concorrência voraz do setor, com a consagração da produção chinesa e o estabelecimento da chamada fast fashion. A solução tem sido unir forças. A J. Dege & Sons, no número 10 da rua, por exemplo, abriga os ateliês de várias alfaiatarias.

A Savile tem se mantido como um dos mais tradicionais redutos da moda no mundo, mas também tem lá sua faceta contestadora quando se trata de atrair jovens talentos. Foi na região que, em 1985, Alexander McQueen, com apenas 16 anos, pediu emprego na Anderson & Sheppard. Ali aprendeu os cortes clássicos e o apuro técnico que, entre outras coisas, o consagraria como um dos maiores nos anos seguintes. Também foi lá que começou a extravasar sua rebeldia. Certa vez, chegou a escrever com agulha e linha uma mensagem para o Príncipe Charles, no forro de um terno que havia costurado para ele. Essa atração entre opostos é velha conhecida na Terra da Rainha. Afinal, já diriam alguns, o que seria da formalidade britânica sem a provocação da vanguarda londrina?

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